Terça-feira, 5 de Outubro de 2010
Saímos às 3h da Rua da Baixa. Saímos com 6h de atraso. Mas vamos por partes.
Saímos às 3h da Rua da Baixa. Saímos com 6h de atraso. Mas vamos por partes.
Acordamos cedo na manhã do dia 4 de Outubro (segunda-feira), quer dizer, o Ricardo acordou cedo e passou em minha casa para ver o que andava a fazer. Não me lembro o que me disse.
Cada um de nós tem uma vida para rolar para a frente, mas eu não consegui ajudar o Ricardo a equipar o carro.
A Mariana, a Vera, a Celina e o Hugo deram uma preciosa ajuda na organização do que faltava tratar: documentos, fotocópias, a merendinha para os dois primeiros dias, as baterias para o microfone e o arsenal de medicamentos que trouxemos. Não deu mesmo para sair às 21h como previsto.
Antes do arranque decisivo, fomos tirar uma foto com o Gustavo (Subway Vila do Conde) e com o nosso casal amigo do T Caffé, Adelaide e Manel. Despedidas e…siga!
Arrancamos em direcção ao Porto, o primeiro ponto de passagem do nosso GPS (obrigado Carlos – Set Azurara e Azurara Beach Party). O carro vem tão carregado que, na primeira subida, liga-se uma luz no painel de comandos: o medidor de massa de ar que mandamos arranjar, estava de novo a dar problemas. Preocupação com essa luz? Resposta do Ricardo: “É aquela peça que não quisemos comprar, porque só influencia na força do carro”. Pois é, metade do caminho é a descer, de certeza que a outra metade será a subir. Diz o Ricardo: “Depois vê-se, mas se calhar devíamos comprar essa peça...”.
4h30 – Figueira da Foz
Fizemos 20 Km às voltas na Figueira. O GPS estava certo, a teimosia do Homem é que costuma dar asneira. Para quem vai a caminho de África, com 12 mil km de viagem na sua totalidade, perder-se na Figueira da Foz não augura nada de positivo, quer para o tempo de viagem, quer para o depósito de combustível. Prosseguimos pelas nacionais e desviamos para o interior, queríamos evitar o Algarve. O nosso carro deve estar tão ilegal em relação ao peso e espaço de carga, que o ideal é fugir dos grandes centros.
11h – Beja
Paramos para lavar a cara e os dentes. Paramos no Continente para comprar um cartão de memória para a câmara, e trouxemos ainda acendalhas e uma grelha para assar. Fizemos alguns telefonemas e estávamos a preparar-nos para sair de Portugal em direcção a Huelva (Espanha). Fizemos 610 Km e atestamos o depósito de novo.
13h-19h – Espanha
Sempre pelas nacionais, fomos desbravando caminho até Tarifa, mas ainda faltam quase 500Km.
Passamos Huelva e Sevilha, onde o transito estava um caos. Estávamos a perder muito tempo. Pensamos que já não íamos apanhar o Ferry para Tanger, até descobrirmos que o último partia às 21h. Estávamos seguros.
Compramos o bilhete de ida-e-volta. Fica mais barato e pode ser utilizado durante um ano, ou seja, não precisamos de marcar o regresso e ficar com medo de o perder no caminho inverso. Pagamos 300€ pela Chaimite e pelos nossos bilhetes.
19h30 e já estávamos dentro do Ferry. Preenchemos o formulário de entrada em Marrocos e fomos para o convés do navio para apanhar um pouco de ar e tirar umas fotos.
O barco partiu às 20h em ponto. Não demorou muito até o homem que nos deu o documento com o código de ingresso, nos aparecer à frente. Tinha-me esquecido do nosso dossier da viagem. Este dossier vale ouro: mapas, informações úteis, e documentos de outros viajantes por África. Tivemos sorte em ter o livro de volta.
A viagem entre Tarifa e Tanger, dura cerca de 40 minutos, que pareciam uma eternidade, para quem via o Sol a desaparecer para dar lugar à Lua. Chegar de noite a Marrocos não estava planeado, muito menos preparado.
20h45 – Tânger, Marrocos.
Estávamos avisados que na fronteira poderiam complicar-nos um pouco a vida. Sabíamos que se colocássemos uma nota de 10€ no meio de um dos passaportes, tudo iria ser mais fácil: evitava demoras e uma revista ao carro muito detalhada. Mal saímos do barco já era tarde para preparar fosse o que fosse. Fomos logo guiados ao portão que dava acesso a Marrocos, mas quando demos conta éramos o único carro estrangeiro. Nesse momento percebemos que, tão cedo, não iríamos sair dali. Assim foi. Sem uma ordem específica de acontecimentos foi mais ou menos assim: passaportes, número de entrada que nos tinham dado no barco, mil perguntas sobre o destino, primeiro polícia a pedir dinheiro – demos 3€ – seguro do carro, livrete e registo de propriedade, segundo homem a pedir dinheiro – não demos – procuração para poder conduzir o carro – o carro está no nome do pai do Ricardo, faltava selo do notário (claro que faltava, ehehehe) – ida do Ricardo à Polícia, onde afirmaram que ele era Francês e ele disse que não, 3º homem a pedir dinheiro – mudo e sem farda, mas estava ali na Aduana – o Ricardo continua a dizer que não fala Francês nem Inglês porque é Estudante de Ginástica e que, por isso, não precisa de saber línguas, só correr (Serão assim tão cegos que não viram o corpo atlético do Ricardo?), Ricardo de volta ao carro, vistoria da mala, chega o Chefe daquela gente toda, arrogante, a berrar connosco porque para passar em Marrocos com roupa é preciso declarar – claro!! – chega um homem que falava quase português a dizer que se déssemos 10€ não havia problema, a vistoria não corre bem (como não queriam tirar tudo da mala, mandaram-nos para um camião RAIO X para examinar ao detalhe a mala do carro). Frustrados por não terem por onde nos pegar ficaram desta forma: 1º fiscal levou 3€, o que falava português levou 3€, o mudo que estava aos “berros” a incentivar que tirássemos tudo da mala ficou de mãos a abanar, o chefe da polícia e o seu ajudante estavam tão chateados por não poderem pegar mais connosco que nos resolveram roubar, literalmente roubar, duas bonecas que estavam na mala. Saímos e percebemos que não ficaram muito satisfeitos, mas saímos.
22h45 – Centro da Cidade de Tânger
Duas horas de terror no Porto de Tanger, estávamos sem sítio para dormir, não tínhamos jantado e andávamos às voltas pelo trânsito infernal da cidade. A cidade estava acordada e nós cheios de sono. Já percebemos que temos de ser cautelosos a conduzir, há pessoas a atravessar em todo lado, carros que buzinam de e para todas as direcções e, para finalizar, um exército de pequenas scooters a pedais. Decidimos conduzir em direcção a Rabat, onde teríamos de pedir os vistos de entrada na Mauritânia.
No momento em que saímos de Tanger, percebemos o que são os controlos policiais em Marrocos: são muitos! Polícia por todo lado. Tínhamos chegado a acordo que estaríamos particularmente atentos à velocidade e que andaríamos sempre 10km/h a menos que o limite, evitando assim os radares.
As placas de direcções são claras, pois estão em árabe e francês. Às vezes só em Francês, outras vezes só em Árabe. O GPS ganha sempre e tem sempre razão. Perdemo-nos e desperdiçamos 1h e 80 Km. Em 1300 Km, já tínhamos 100 a mais, contanto com os 20 da Figueira da Foz.
Paramos para eu ir buscar água à mala do carro, coloquei umas coisas em cima do tejadilho. Já comigo dentro do carro, o Ricardo arrancou e passados uns 20 segundos, ouvimos um barulho. Lembrei-me nesse momento das coisas que estavam em cima do carro: um saco com cópias de todos os nossos documentos, um tripé e uma camisola. Voou tudo para o chão. Apanhei uns 100 papéis espalhados por uma estrada cheia de camiões e sem luz. O tripé partiu a manivela de altura e tinha acabado de perder o sapato, que deve ter saltado.
O Ricardo é o condutor de serviço e vai fazendo quilómetros, enquanto eu vou passando pelo sono e perdendo coisas para contar: a caminho de Rabat, desvio forçado para não atropelar uma vaca enorme que estava no meio da estrada, camiões que ocupam quase a estrada toda e que não se desviam ou abrandam, cães por todo lado, motas sem luzes, bicicletas com duas e três pessoas...
Quando passávamos Kenitra, pequena cidade a 20 Km de Rabat, decidimos dormir um pouco. Depois de alguns receios em parar o carro, estacionamos numa bomba de gasolina cheia de camiões e dormimos, basicamente, sentados, pois coisa que a nossa Chaimite não tem é espaço.
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